Psicodrama e Educação

Acreditando que o uso do psicodrama na educação e na escola, por intermédio de profissionais da psicologia, da pedagogia e de outras áreas interessadas possa ser de grande utilidade, construí este espaço virtual, na intenção de mostrar algumas facetas dessa interação. Desejo despertar no internauta o desejo de se aprofundar no conhecimento do profundo, amplo e sempre útil psicodrama, que por meio “da ação” me fez perceber a sua importância na minha própria formação.

12.12.06

Agradecimentos


Para contruir este trabalho contei com o grande apoio do meu companheiro Fernando Fernandes que me ajudou muito na construção da música que está nesse blog disponível para vocês. Igualmente agradeço ao Henrique do Estúdio Prof. que gravou a música com a maior gentileza do mundo. Agradeço também ao meu irmãozinho gigante, Rafael, pelo incentivo e pela força. Vocês são muito fofos!!! Não poderia deixar de agradecer a vocês em especial ao Nando!!!

Música psicodrama na escola

Composição e voz: Juliana Sousa
Arranjo: Fernando Fernandes
Instrumentos: Fernando Fernandes
Gravação: Henrique - Estúdio Prof!!!

http://www.splicemusic.com/user/juliana/sounds/

Fiz essa música tentando falar um pouco sobre o teatro na escola. Para acessar a música clique no link acima que abrirá uma nova página. Desça até o final dessa nova página e procure pela música Psicodrama na escola. É só aperta o botão "play".

10.12.06

Reflexões pessoais...


Encontro com o Psicodrama...

A construção desse trabalho me proporcionou momentos muito prazerosos e de descoberta sobre o psicodrama. Quando tive a idéia de fazer esse trabalho, bucando realizar pontes entre o psicodrama e a escola, pensei que seria um pouco difícil achar material em fontes acessíveis, como na própria internet. Durante a minha formação na Universidade de Brasília não tive muito contato com a área escolar e somente no último ano pude cursar uma disciplina que trata a respeito de grupos, nunca estudei psicodrama na UnB, infelizmente. Mas não sabia que fora da Universidade a aplicação do psicodrama na escola e em outras instituições é tão usada. Essa foi a primeira grande descoberta que a construção desse portfolio virtual me proporcionou.

A segunda diz respeito à história do psicodrama na escola/educação. Apesar de ser muito usado na área de educação, pois assim me pareceu, não pude encontrar estudos que falassem do uso do psicodrama na escola no exterior. Assim, a construção desse trabalho me deixou algumas dúvidas com relação à história do psicodrama na educação fora da América Latina.

A terceira descoberta diz respeito à utilidade do psicodrama na escola e na educação como um todo. Ao construir esse trabalho me vi estudando coisas reais. Ele me auxiliou a compreender de uma forma mais realista a função e a prática do psicólogo escolar. Devo confessar que até a metade do semestre, aproximadamente, tinha uma compreensão muito teórica da psicologia escolar. Agora me sinto mais próxima da prática do psicólogo escolar.

Uma quarta descoberta diz respeito a uma dimensão mais afetiva e pessoal. Não somente por meio da construção do portfolio, mas também com o auxílio dele pude ter certeza de que a abordagem do psicodrama corresponde aos meus anseios profissionais enquanto curso de formação em nível de pós-graduação. Com a construção do portfolio pude me aproximar ainda mais do psicodrama. Estou fazendo a formação em psicologia clínica na SOBRAP e tive a oportunidade de conhecer um pouco mais sobre a formação em psicodrama institucional, o que foi muito rico para mim. Assim sendo, concluo que nesse semestre amadureci papéis no nível profissional e pessoal, por meio do encontro com o psicodrama.


Vida de Moreno

Fundador do psicodrama, Jacob Levy Moreno é caracterizado por muitos autores como uma figura carismática, com muita vitalidade. Segundo pesquisas de Bratescu, Moreno nasceu em 6 de maio de 1889, era de origem judaica. Aos cinco anos de idade ocorreu a dita “brincadeira de ser Deus”, na qual ele e várias crianças brincavam de “ser Deus e seus anjos”. Moreno era Deus na brincadeira. As crianças empilharam várias cadeiras e ele ficou sentado no alto, com os anjos (outras crianças) dançando ao redor. Ao lhe ser dito que Deus voava Moreno então pulou do alto para um tombo no qual quebrou um braço.

É importante lembrar que Moreno teve até certa idade muita influência religiosa, chegando a formar com seus amigos a religião do encontro. Ele e seus amigos perambulavam pelas ruas como os mais pobres e faziam jogos de improviso com as crianças.

Moreno chegou a conhecer Freud ainda na faculdade de Medicina em 1912, quando Freud ministrava um curso de verão em Viena.

Os quatro momentos de Moreno

Alguns autores dividem didaticamente a trajetória do pensamento de Moreno em quatro Momentos. Eis os dois primeiros momentos:

Até 1920

Religioso e Filosófico – Havia predomínio de temas relativos à existência, com influência religiosa do Hassidismo (proveniente do judaísmo) e das idéias de Kiekergard e de Bergson. Nesse período ele realiza teatro com as crianças, faz também trabalho com as prostitutas, chegando a facilitar a criação de um sindicato das prostitutas (1913-1914) e também realizou prestação de assistência a refugiados de guerra. Moreno demonstrava nesse momento uma inclinação pela simplicidade, uma busca harmoniosa na sua relação com Deus, mas já falava de espontaneidade, criatividade e de superação.


De 1921 a 1924

Teatral e Terapêutico – Há predomínio do tema do teatro em si. Nesse período ocorre a primeira sessão psicodramática oficial em 1921 no Komödien Haus de Viena, um teatro. Nesse momento, Viena atravessava um período de muita instabilidade política, pois no pós-guerra não havia nenhum líder, nenhum rei. Assim sendo, no dia 1º de abril de 1921, Moreno, dirigindo o teatro abre as cortinas e platéia dá-se de frente com um trono vermelho, semelhante a um trono real, com uma coroa em cima. Moreno propôs aos membros da platéia que se sentassem no trono e mostrassem como iriam reinar. O restante do público deveria julgar o aspirante a rei. Ninguém foi considerado apto a exercer tal cargo. Ainda nessa fase Moreno funda o “Teatro da Espontaneidade”. No seu entendimento, ele vislumbrava o teatro como um dotado de grande potencial catártico, mas achava que os textos não deveriam ser decorados, mas sim o ator seria autor e criador de sua história.

Os dois últimos momentos de Moreno

Teatro de Moreno em Beacon

De 1925 a 1941

Sociológico e Grupal – Nessa fase Moreno centra suas preocupações sobre aspectos sociais e com a dinâmica de grupo. Nesse período Moreno emigra para os EUA (1925) construindo o seu teatro terapêutico em Beacon (1936) e ligando-se às Universidades de Columbia e de Nova York, com ocorrência também de seus trabalho com deliqüentes jovens na comunidade de Hudson (1932). Moreno, após vir de uma Europa orientada por fenomenologia existencialista decepcionada com a guerra e com a superioridade das ciências para proporcionar solução a problemas humanos e se depara com uma cultura pragmatista, voltada para a medição, com uma ciência psicológica apoiada nos princípios de um behaviorismo radical. Influenciado por esse novo contexto, Moreno cria a sociometria.

De 1942 a 1974

Organização e Consolidação – Nessa fase as idéias de Moreno são estruturadas e aceitas como método de psicoterapia. Há um aprofundamento em direção ao trabalho psicoterápico. Nessa fase é publicado o importante livro de Moreno: Fundamentos do Psicodrama. A Fundação “Moreno Institute” e “The American Society of Group Therapy and Psychodrama” são fundados.

Referências:

Gonçalves, C. S., Wolf, J. R., Almeida, W. C. (1988) Lições de Psicodrama: introdução ao pensamento de J. L. Moreno. São Paulo: Ágora.

- Assistência de aulas da SOBRAP.




Histórico do psicodrama na escola

Desde as colocações de Moreno em: "O Psicodrama na educação" (publicadas originalmente em 1929 e republicado em: Moreno, 1987, p. 197-205), diversos psicodramatistas têm se dedicado ao desenvolvimento do psicodrama aplicado à escola. Dentre eles se destacou M. A. Romaña, que desenvolveu o "Psicodrama Pedagógico".

Romaña (1996) cita em seu livro uma trajetória do psicodrama pedagógico. Ela cita que em 1963 ocorreu a primeira experiência de aplicação do psicodrama na educação na Escuela de Belas Artes na Argentina, aonde se trabalhou a simbolização de conceitos. Logo depois foram feitas experiências em pré-escolares. No período de 1964 a 1966, foram feitas dramatizações em aulas de pedagogia. De 1966 a 1968 foram realizadas demonstrações frustrantes em educadores que não aceitavam a dramatização como ferramenta didática. Em agosto de 1969, em um congresso em Buenos Aires foi realizada a apresentação oficial do psicodrama pedagógico. Em 1970 se fundou a primeira escola de psicodrama pedagógico de que se tem notícia.

A proposta do psicodrama pedagógico de Romaña foi muito importante por representar o início da utilização da dramatização na escola. Mas sua utilização é restrita à finalidade didática, tanto que a sua proposta se destina à educadores. Atualmente, o uso do psicodrama na escola tem-se expandido para outras aplicações, adentrando na prática do psicólogo escolar, não somente do professor. Se entendermos a escola como composta por vários sub-grupos, podemos dividí-la em grupos de pais, de alunos, de professores, de gestores (orientadores, diretores), de apoio (serventes, bedéis), comunidade (amigos da escola, vizinhança...). O psicodrama tem sido aplicado a todos esses grupos descritos anteriormente, como revela a entrevista com Gessilda (da Sociedade Brasileira de Psicodrama) e como mostram os estudos de Paula (2006) que trabalhou com os alunos e seus pais, e Andrade (2002).

Mas a abordagem de Romaña tem ainda encontrado seus adeptos como o estudo de Borsato e Andrade (2000). Os estudos de Solange L’Abbate (1994) e de Ruiz-Moreno et al (2005) refletem essa tendência, aplicando o psicodrama à educação de profissionais de saúde, proporcionando reflexões desses profissionais sobre sua prática, sobre as relações hierárquicas entre outros assuntos. L’Abbate aponta a importância de se entender que a formação do profissional de saúde se reflete no atendimento ao usuário.

Referências


ANDRADE, A. S. (2002) “Sociodrama Educacional: Grupos de Professores, Alunos e Pais”. Revista da SPAGESP - Sociedade de Psicoterapias

versão sintética disponível em: http://gepsed.ffclrp.usp.br/socd-educ.pdf

ANDRADE, A. S. (2000) “Sucesso, Dificuldades e Resistências no Uso da Criatividade e Espontaneidade Dramática na Prática de Sala de Aula em um Grupo de Professores”. Em: Guarnieri, M. R. (Org.) Aprendendo a Ensinar: o caminho nada suave da docência, Campinas, SP.

Borsato, C. R. e Andrade, A.S. (2000) Assessoria à Professores de 1a. a 4a. Séries Visando o Desenvolvimento do Profissional Reflexivo a partir dos Princípios do Psicodrama Pedagógico (Resultados Preliminares).São Paulo: FEBRAP, Revista Brasileira de Psicodrama, 8(2): 69-82. Trabalho desenvolvido pela primeira autora como Dissertação de Mestrado junto ao Programa de Pós-Graduação em EducaçãoEscolar na FCL/UNESP, Campus de Araraquara, sob a orientação do segundo autor e subvencionado pela Fundação de Amparo À Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP).

L’Abbate, S. (1994) Educação em Saúde: uma nova abordagem. Caderno de Saúde Pública. 10 (4), 481-490

Ruiz-Moreno, L., Romaña, A., Batista, S. H., Martins, M. A. (2005) Jornal vivo: relato de uma experiência de ensino-aprendizagem na área de saúde. Comunicações em Saúde e Educação 9 (16), 195-204.

resenha...


Romaña, M. A. (1996) Do psicodrama pedagógico à pedagogia do drama. Campinas: Papirus.


Alicia Romaña coloca que o teatro no psicodrama possibilita o desempenho de diferentes papéis. Ela destina esse livro aos educadores, defendendo a idéia de que o psicodrama deve ser usado na escola como ferramenta pedagógica, com finalidade didática. Para Romaña a educação deve ser criativa e autônoma, sendo que o psicodrama seria uma ferramenta adequada, na medida em que garante a aquisição do conhecimento no nível intuitivo e intelectual, levando à maior participação do aluno, por priorizar a “ação”.
Não se trata de usar a dramatização em todas as aulas. A autora pontua enfaticamente que tal ferramenta deve ser utilizada periodicamente, mas nunca constantemente. A dramatização pode ser usada nas seguintes situações: 1) fixar e exemplificar o conhecimento; 2) encontrar as soluções alternativas aos problemas disciplinares; 3) desenvolver papéis novos; 4) como prevenção de situação ansiógenas (provas); 5) sensibilizar grupos; 6) elaborar mudanças; 7) avaliar o trabalho em equipe.

Ainda nesse livro são apresentados exemplos de como fazer o psicodrama na sala de aula, são ainda destinado espaços para análises de trabalhos de autores importantes como Paulo Freire e Vigotsky, frente às questões suscitadas pelo psicodrama pedagógico.

Entrevista com Gessilda, psicóloga da SOBRAP (Sociedade Brasileira de Psicodrama)


Brasília, 14 de novembro de 2006

Falando sobre a sua trajetória pessoal no psicodrama

Antes de me formar eu já havia me interessado pelo psicodrama. E a SOBRAP foi criada em 1972. Eu me formei em 1973, então já em 70 teve um congresso internacional de grupos em São Paulo. Eu conheci lá um bocado de gente e aí nós formamos um grupo de psicoterapia, não existia grupo de psicoterapia por aqui. Existia o começo do psicodrama moreniano. Mas nós trouxemos a idéia de formar um grupo para fazer uma formação que tinha que se fazer primeiro psicoterapia de grupo, para depois entrar na teoria e na prática. Nós trouxemos, enquanto grupo de estudantes, pessoas do Rio e fazíamos terapia sexta, sábado e domingo, uma vez por mês. Daí, depois que terminou esse período nós não tínhamos profissionais pra fazer formação em Psicodrama Triádico.

O Psicodrama Triádico tem como base a junção da psicanálise, do psicodrama e da dinâmica de grupo. Foi criado pelo Pierre Weil e a Anne Schützenberger. na França. E essa formação dá liberdade para entrada de outras referências como o corpo, dança, música. Não é só da área clínica, pode ser aplicado na comunidade. O psicodrama Moreniano pode ser usado também na área clínica (só para médicos e psicólogos) e na área institucional. Nós chamamos de Psicodrama Triádico Institucional, esse que pode ser ampliado para outras áreas, esse qualquer profissional pode fazer, principalmente se tiver interesse pela área de grupo.

Enfim, nós terminamos nossa psicoterapia e procuramos profissionais de fora para dar a nossa parte teórica, porque nós tínhamos que ter, no mínimo, 360 horas divididas com psicodrama, psicanálise e dinâmica de grupo. A dinâmica de grupo (DG) aqui não é entendida como técnica, mas como estudo de grupo. Esse termo DG é muito mal interpretado, é visto como técnica. Mas nós usamos aqui como o uso de Lewin, em termos de estudo do grupo, sua estrutura, processos e conteúdos de grupo. A técnica é um dos instrumentos que se pode usar. Então, nós chamamos para nos ensinar o psicodrama na leitura triádica o Pierre Weil. Ele morava em Belo Horizonte e vinha uma vez por mês e nos dava a teoria e a supervisão. Depois de vir para cá ele ia para Recife, pois ele tinha outro grupo de estudantes também. Mas o grupo de Recife não foi para frente. Mas então, terminando o módulo de psicodrama, nós chamamos a Fela Moscovici que é uma grande especialista em grupo, formada nos EUA. Ela nos deu a parte de grupo. E pedimos autorização – pra SOBRAP - para estudar com um psicanalista daqui de Brasília a parte referente à psicanálise, principalmente voltada para grupos. Naquele momento, a SOBRAP ela tem uma nacional que coordena as regionais. Naquele tempo, a nacional não tinha nem forças. Ela estava se formando. A primeira Regional foi em BH, depois Rio (...) A nacional é que tem aprovar os cursos. Nós chamamos um psicanalista daqui de Brasília, apesar dos psicanalistas não acharem que a psicanálise pudesse ser aplicada nos grupos, mas nos ensinaram e depois nós nos aprofundamos na escola francesa, na área de grupos, com autores que buscaram a fundamentação da psicanálise dentro de uma leitura de grupo. Estudamos também textos de Freud, Mal-estar da civilização, teoria dos grupos de Freud. E então, nós ficamos interessados na formação em DG de consultores e coordenadores de grupo, que já é mais voltado para área organizacional, das instituições. Então eu fiz a formação em DG com a Fela, com 360 horas mais parte prática. Fiz a de psicodrama e fiz a de psicanálise. Eu tenho, portanto as três formações básicas do psicodrama triádico. A gente vai estudando uma coisa e vai querendo estudar outras. Eu comecei a aplicar o psicodrama tríadico inicialmente na área clínica, inclusive eu dizia pra Fela que eu nunca iria para as organizações, porque eu era terapeuta. Trabalhei por muito tempo com grupos na área clínica, com crianças, adolescentes, com adultos.

Co-coordenação

Na SOBRAP nós trabalhamos com a co-coordenação. Não é um que é coordenador e o outro é “co”. Não é como no psicodrama moreniano que tem o diretor versus ego-auxiliar. Temos uma dupla que faz trocas entre si, os coordenadores. Os egos-auxiliares surgem do grupo. O próprio membro do grupo entra quando precisa ajudar o grupo fazendo papéis com o protagonistas. Nós fazemos isso baseado na co-coordenação, baseado na idéia de par parental, que é o pai e mãe, pegando a teoria da psicanálise. Seria de preferência ter um homem e uma mulher, mas é muito difícil ter o homem. Então nós trabalhamos em dupla e o grupo vai projetando nos coordenadores os papéis de pai e de mãe. Isso é que vem psicanálise, com a idéia de transferência, da interpretação, da resistência, inconsciente, conteúdo manifesto, latente, tudo isso dentro do grupo.

Leitura de Grupo

Agora, deixa eu falar uma coisa muito importante no psicodrama triádico que é a leitura do grupo. O que o grupo está vivendo no aqui-agora? Dependendo do que o grupo está vivendo no aqui-agora nós nos valemos de uma metodologia de DG, trabalhando o grupo em termos de comunicação, liderança, poder, inclusão, toda aquela história de movimento de grupo. Se o grupo está tendo, num momento, coisas não ditas, conteúdos não ditos, manifestando sobre a forma de atuações, de resistência, aquele embasamento da psicanálise, nós entramos com a leitura psicanalítica. Usamos interpretação, deixando o grupo livre, fazendo associação livre do grupo, vendo os símbolos do grupo, vendo a linguagem do grupo, numa leitura de que tem algo manifesto, externo, mas por trás tem o inconsciente. Então a gente usa os instrumentos da psicanálise, linguagem, associação livre, a interpretação, a transferência, tudo de grupo. E se o grupo precisar, se ele está pedindo algo de psicodrama, a gente dá o protagonista, o ego-auxiliar, com técnicas psicodramáticas, do espelho, da cadeira vazia, duplo. Então, o importante é ler grupo, a gente prepara, leva técnicas variadas. Mas é o grupo que vai te dar o material que você vai trabalhar. Por isso é sempre importante ter um momento de aquecimento para surgir, pra surgir dali algo de grupo ou algo individual. Agora, a aplicabilidade: se estamos trabalhando com a clínica a gente focaliza o trabalho do indivíduo no grupo e trabalha o grupo, a família. Mas o foco é mais intra-individual. Enquanto que no trabalho com as instituições o foco é o “inter” e no grupo.

Então, se baseando dentro do psicodrama moreniano que tem na socionomia moreniana a psicodinâmica, a sociometria e a sociatria. A psicodinâmica é o trabalho da liderança, da comunicação, toda essa coisa do processo de grupo que para nós do triádico cai dentro da DG, de processo de grupo, de estudo de grupo. A parte da sociometria é que se vai medir por meio de instrumentos sociométricos as relações entre as pessoas de aceitação e rejeição, como o grupo se forma pela escolha. A gente trabalha com isso, existem técnicas. Qualquer profissional pode trabalhar com essa parte da psicodinâmica e da sociometria. Isso você pode aplicar na sala de aula, como por exemplo, a sociometria, perguntando com quem na sala de aula os alunos gostariam de fazer um trabalho. A partir daí você faz a rede sociométrica, você percebe aquelas pessoas que tem mais liderança, que são mais escolhidas e também as pessoas que são mais rejeitadas, mais excluídas. A partir daí o professor/profissional vai fazer um trabalho pra incluir essas pessoas que estão excluídas em formas de trabalhos de grupo. Essas pessoas que são as estrelas (líderes, mais escolhidas), elas têm uma força muito grande, então pegamos essas pessoas pra ir formando, e, não cristalizando panelinhas, grupinhos. Outra pergunta que pode ser feita é com quem você não gostaria de trabalhar. Com isso vai se trabalhando no grupo as rejeições, porque não se gosta de tal pessoa, será que é porque ele não faz o trabalho direito, é irresponsável. Daí vai-se trabalhando as forças, os conteúdos que formariam a força impulsora para aquele trabalho e diminuindo as forças restritivas para aquela convivência. Por exemplo, em determinado momento meninos e meninas não se misturam por conta das diferenças do sexo. Essa seria a hora do professor fazer trabalhos focando as diferenças, características, o que é um menino, uma menina, inclusão de pessoas que têm problemas. Claro, sem formar um grupo dos excluídos! A sociatria (socio = amigo, tria = doença, grupo de amigos está doente) seria aplicar técnicas para melhorar esse grupo que não está legal, só que na área institucional (comunidade, escola, hospital) não se usa o foco intra, não se traz o indivíduo à tona. O foco é no inter e no grupo. Tem-se uma série de trabalhos, de técnicas que focam o grupo. Um exemplo com a leitura da psicanálise com o professor que fez a formação e sabe ler o que o grupo está expressando. Ele não vai chamar atenção pra Maria, pro José. Daí o grupo fala que é o final de ano, tensão. Então, o professor pode propor um trabalho pra relaxar o corpo, movimentos, pra entrar na sala legal. É claro que vão ter os papéis de palhaço, de gozador, são os papéis que surgem no grupo. E o professor vai vendo como esses papéis podem fortalecer o grupo, usando como força impulsora para o objetivo, não excluindo-os, mandando-os pra diretoria, não criando rótulos como o do garoto terrível. O professor deve pensar a: “tua hiperatividade vai ajudar esse grupo, não vai atrapalhar, como? Você é incrível, criativo, inteligente.” Então esse tipo de trabalho na instituição é o sociodrama e não o psicodrama, o grupo que é trabalhado e não o indivíduo. Tem uma série de meios de fazer isso. Agora, caso se perceba que o indivíduo está muito regredido, e por isso não consegue se incluir, ele tem trabalhos no grupo e tem o apoio do psicodrama (mais clínico), pode ser o bipessoal ou de psicoterapia.

O papel do Psicólogo Escolar

Não é o psicólogo da escola que fazer esse trabalho. O psicólogo da escola tem que ter uma formação de leitura de grupo e de ver as forças impulsoras e restritivas e trabalhar por meio do sociodrama num foco triádico. Pode-se trabalhar o sociodrama numa leitura psicanalítica dos excluídos por meio da auto-imagem, de não ser incluído na família, de ter rótulos. Isso tudo é jogado na sala de aula! Mas o que se deve entender é que na sala de aula não somos todos iguais, isso é uma mentira. Nós somos todos diferentes e cada um tem coisas boas e ruins. A partir disso, pode-se trabalhar as polaridades, dentro da psicanálise que é a pulsão de vida e a pulsão de morte. O que eu uso de coisa boa e de ruim para o objetivo que é a aprendizagem? É muito importante não perder de vista o objetivo de aprendizado, não é o lúdico. Claro que o social é reforçado, que a sexualidade também é trabalhada, mas o foco é aprendizagem. Pode-se aprender por meio de técnicas de psicodrama, mas fazendo-se leitura de grupo. Se a matéria tá difícil, pode-se usar psicodrama.

O Triádico tem três momentos: aquecimento, vivência e processamento (fechamento). Aquecimento: aquecer-se para se preparar para o que está sendo proposto. Por exemplo, se vamos estudar o corpo humano, pode-se propor uma técnica de grupo focando o contato, o olhar. Daí vem uma técnica que trabalha o corpo humano, por exemplo, quebra-cabeças, usando pedaços que formarão o corpo. Pode-se trabalhar a competição, a inveja, quando, por exemplo, alguém não quiser fornecer uma peça para completar o quebra-cabeça. Como isso se reflete na aprendizagem? Imagine que tem os nerds que não querem se misturar com os danadinhos. Imagine se os nerds, vivem uma situação de exclusão, quando o grupo vai fazer uma farra. Isso que a gente vai trabalhando: a característica do grupo, através da linguagem ou da dramatização, dos jogos, mas em grupo. Se alguém ficar muito fora e o professor perceber que por mais que se faça trabalhos de grupo ele permanece com suas dificuldades, então é reforçado que se busque um apoio fora. Mas o próprio grupo vai fazer o máximo que puder pra ter as diferenças e não a igualdade.

O CFP fala que não se pode ensinar psicodrama para outros profissionais. Isso está errado! O que não pode é ensinar a linha clínica, mas a institucional pode ser útil para vários profissionais: o profissional do teatro, o fisioterapeuta, da educação física, o professor. Mas trabalhar o indivíduo é só o psicólogo e psiquiatra que podem.

Agora, a escola envolve a comunidade (família), a empresa (diretores, professores, orientadores serventes) e alunos. Então, a gente pode trabalhar a escola em vários grupos. Pode ir trabalhar os pares, a administração, professores, os orientadores, o grupo de apoio que são os serventes, que é o que a gente chama de trabalho de equipe. E pode trabalhar os alunos na sala de aula, junto com os professores, para trabalharem as relações interpessoais, pra não formarem panelinhas, alianças, que dificulta também, são coisas restritivas.

Pergunta: Como é na prática do psicólogo escolar trabalhar com a administração? Trabalhar com o professor é mais fácil do que com os administradores, diretores?

Não percebo muita diferença. De vez em quando eles, diretores, convocam um trabalho de diagnóstico, que é assim para ver como está aquela escola. A gente escuta o gerente, os gestores, secretários, pra levantar as necessidade daquela escola, pra gente ver onde que tá a força mais restritiva, se é a metodologia, se são os pais se é a comunidade... Vamos dizer que a escola esteja próxima do foco de droga. O primeiro passo é fazer o diagnóstico daquela instituição, levando em conta a comunidade, os pais, os gestores (administradores, professores, serventes). A gente não separa os professores dos diretores e serventes. A gente gosta de trabalhar todo mundo junto. É um trabalho curto pra ver o que precisa ser trabalhado. E, por exemplo, se o problema é de comunicação, trabalhamos um pouco esse aspecto. Se precisarem eles chamam a gente de novo. Geralmente eles pedem esse trabalho antes do período de aulas recomeçarem, em julho... É bem focal. Já o trabalho de pais, a famosa reunião de pais, se você puder trabalhar em forma de DG e de sociodrama, é lindo. Fazer o que aqueles pais querem trabalhar: a irresponsabilidade do filho, a frustração de não ter um filho nerd, de ter filhos diferentes! Nada tem enfoque individual, tudo é sociodrama. Se tiver, inclusive um professor que é massacrante, a gente trabalha ele no grupo também, junto com os outros, até que o grupo esteja forte pra dizer que a forma daquela pessoa lidar perturba, incomoda. Daí se a pessoa ficar mobilizada ela mesma procura psicoterapia. Até diminui licensas, afastamentos... Porque os professores vão tendo um lugar pra ir expressando raiva, frustração, prazer, em forma de grupo.

Lembrando que a sociometria visa trabalhar com a rejeição e aceitação, não visa formar um grupo lindo unido, mas que seja um grupo verdadeiro. Eu gosto de trabalhar com fulano, mas não gosto com ciclano. Eu me sinto bem com a orientadora tal, mas não gosto de trabalhar com a outra, por isso e isso... E eles vão vendo essas coisas. Mas isso é trabalhado no grupo. E o trabalho de comunidade é geralmente a programação de temas, como a eleição, por exemplo. Trabalhar cidadania, a importância do ecossistema. Os amigos da escola são exemplos de comunidade. Mas esses projetos ficam lindos em escolas públicas. Fizemos um com as crianças bem-dotadas, mas a gente trabalhou a escola, pra receber essas crianças, os pais, como ter filhos superdotados e as crianças pra não se sentirem “os bons”. Por exemplo: “Sabe, você é ótimo em uma coisa, mas não em outras.” Nós trabalhamos a análise das competências, por exemplo: “você é ótimo em música e péssimo em matemática. Então você vai precisar da matemática pra questão do tempo, do ritmo.’ E isso é trabalho que se faz e grupo, com jogos, com sociodrama.

E como se encontra o mercado de trabalho na área...

As coisas não são fáceis nem difíceis. Você tem que olhar a sua identificação, o seu desejo. Você vai se formando, se apresentando, com o tempo. Tem um livro que se chama Cartas para um jovem terapeuta, que é do Caligaris, que faz parte de uma coleção... Esses livros falam do começo da carreira. No começo, claro que você não vai ter um ganho, leva um tempo, que se conquista, de reconhecimento da sua área. Por exemplo, a Marisa começou na Fundação, eu comecei na Secretaria e aí a gente vai sendo conhecido e vai construindo a identidade. As pessoas pensam “a Gessilda trabalha com criança”, mas eu trabalho com organização também, mas isso não é conhecido. A gente vai conquistando, mas tem que ser responsável, ter coragem. É claro que não é fácil já começar com emprego. Segundo o Freud tem três profissões muito difíceis: ser psicanalista (psicólogo), professor e político. Porque é uma coisa que você tem que amar, porque tem tantas dificuldades, barreiras, que se você não gostar fica difícil.

Resumos de Artigos Científicos

Psicodrama Aplicado a Grupos de Crianças com Dificuldades de Aprendizagem


Antônio dos Santos Andrade


Em sua introdução, Andrade faz um histórico sobre o uso do psicodrama em crianças com dificuldades de aprendizagem. O primeiro estudo data de 1971 e revela o uso do psicodrama em crianças surdas com finalidade de tratamento e de reabilitação. Ele mostra também que houve aplicação do psicodrama em crianças muito talentosas e criativas. O primeiro estudo citado com crianças mentalmente retardadas, termo que ele mesmo utiliza, é de 1985. Ele apresenta dados de estudos nos quais as crianças mentalmente retardadas tiveram progressos muito importantes por meio do psicodrama. Kaufman e Gonçalves (1988) propõem a denominação de Psicodrama Moreniano àquele no qual se busca propiciar as condições para a emergência de novos papéis e a consolidação dos papéis pouco desenvolvidos ou mal-estruturados, fundamentados na concepção moreniana de espontaneidade e criatividade dramática. Esta abordagem utiliza poucos brinquedos e o terapeuta diz à criança para representar, “como se estivesse em um teatro”. Em síntese, esta abordagem procura dar às crianças o máximo de liberdade possível na escolha de brincadeiras, jogos e atividades, supondo que esta estratégia lhes propiciaria o desenvolvimento de vínculos no interior de grupo. A dramatização como jogo só ocorrerá no momento em que as crianças o preferirem. Após realizar o seu estudo em crianças com dificuldades de aprendizagem, Andrade conclui que: “A partir dos progressos escolares acima descritos, é possível concluir que o atendimento em grupo, através do Psicodrama Moreniano, às crianças com distúrbios de aprendizagem, parece favorecer o sucesso escolar, interrompendo o ciclo de fracasso no qual elas estavam inseridas, provavelmente pelo fato de implementar nelas suas habilidades de relacionamento interpessoal.”


Artigo publicado originalmente na REVISTA BRASILEIRA DE PSICODRAMA, Vol. 5, No. 2, Ano 1997, p. 93-106 e posteriormente em: ANDRADE, Antônio dos S. (1999) “Psicodrama Aplicado a Grupos de Crianças com Dificuldades de Aprendizagem”. Em: Almeida, W. C. de (Org.) Grupos: a proposta do Psicodrama, São Paulo: Ágora, Cap. 11, p.: 141-155.

Disponível em: http://gepsed.ffclrp.usp.br/dist-aprd.pdf


Sucesso, Dificuldades e Resistências no Uso da Criatividade e

Espontaneidade Dramática na Prática de Sala de Aula em um Grupo de Professores

Andrade pontua que apesar de a criatividade e espontaneidade serem muito exigidas em professores da educação especial, existem muitas resistências por parte dos professores em usar essas potencialidades. Segundo o autor, o psicodrama tem se mostrado muito eficiente para desenvolver criatividade e espontaneidade, o que o levou a pesquisar o uso do psicodrama em professores da educação especial. Foram apresentados inicialmente alguns conceitos básicos do psicodrama e posteriormente passou-se a uma etapa em que ocorreram várias vivências. O grupo conseguiu produzir dramatizações muito criativas e espontâneas. As dificuldades relatadas pelos profissionais são de caráter mais institucional, como a rígida hierarquia, muito centralizadora. Mas dificuldades pessoais que foram internalizadas ao longo da vida como a timidez e inibições também apareceram nas vivências.

Andrade A. S. (2000) “Sucesso, Dificuldades e Resistências no Uso da Criatividade e

Espontaneidade Dramática na Prática de Sala de Aula em um Grupo de Professores”. Em: Guarnieri, M. R. (Org.)

Aprendendo a Ensinar: o caminho nada suave da docência, Campinas, SP, Autores Associados, Cap. 4, p. 61-76.

Disponível em: http://gepsed.ffclrp.usp.br/aprender.pdf


Sociodrama Educacional: Grupos de Professores, Alunos e pais

Andrade

Nesse texto o autor apresenta um modelo de intervenção e de pesquisa por meio do sociodrama institucional. Ele apresenta um histórico do trabalho da psicologia na escola, mostrando como os psicólogos inicialmente se baseavam no modelo clínico atentando para tratar os alunos que eram encaminhados por professores e orientadores escolares. Esse modelo contribuiu para a realização de diagnósticos que visavam desvendar, de uma forma mais objetiva, a dificuldade que se encontrava supostamente na criança. Com isso ocorreu um grande desenvolvimento de testes psicométricos para avaliação das dificuldades dos alunos. A partir dos anos 70 começam as críticas a esse modelo, gerando uma nova forma de pensar a dificuldade de aprendizagem, que passa então a envolver não somente o aluno, mas também a instituição. Foi nesse contexto que a contribuição de Moreno com a sociometria e a sociatria permitiu o surgimento do Sociodrama Educacional como ferramenta importante da psicologia escolar. Para alcançar os objetivos das investigações junto aos grupos de pais, de alunos e de professores, Andrade propõe o uso de entrevistas individuais de profundidade, entrevista em grupo focal, grupo de interpretação lúdica de papéis e observação participante. As estratégias de intervenção propriamente ditas seriam: grupo reflexivo com professores, grupos com alunos e grupos com familiares.

ANDRADE, A. S. (2002) “Sociodrama Educacional: Grupos de Professores, Alunos e Pais”. Revista da SPAGESP - Sociedade de Psicoterapias

versão sintética disponível em: http://gepsed.ffclrp.usp.br/socd-educ.pdf


Educação em Saúde: uma nova abordagem
Solange L’Abbate

Esse artigo descreve uma série de experiências na área de educação em saúde. As experiências, realizadas com profissionais de saúde que trabalham em instituições, começaram com as relações sociais com as quais essas pessoas se envolvem no seu trabalho todo dia, em contato com outros agentes sociais e grupos. Um das premissas básicas é de que as relações sociais são um importante aspecto dos serviços de saúde pública para a população. Como resultado, os profissionais de saúde necessitam de treinamento específico nessa área para que melhorem sua performance. As experiências mostram a importância de se fazer abordagens teóricas e metológicas (como o psicodrama educacional e o método Arvoredo) acessíveis a esses profissionais. Os profissionais que participaram desses programas de treinamento melhoraram consideravelmente suas habilidades profissionais e sociais. Um dos pressupostos básicos dessas abordagens é a constante busca pela autonomia, um elemento crucial para proporcionar a conscientização das pessoas como cidadãs, sejam eles profissionais de saúde ou não.

L’Abbate, S. (1994) Educação em Saúde: uma nova abordagem. Caderno de Saúde Pública. 10 (4), 481-490
Disponível no scielo: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-311X1994000400008&lng=pt&nrm=iso

13.11.06

OS PRECONCEITOS E A INCLUSÃO – UM AUXÍLIO DO PSICODRAMA


OS PRECONCEITOS E A INCLUSÃO: UM AUXÍLIO DO PSICODRAMA

Alguns estudos mostram que alunos com necessidades educativas especiais (ANEE) podem sofrer com a inclusão na medida em que os alunos com NEE, principalmente com deficiência mental são menos aceitos e são mais rejeitados do que seus colegas, passando a maior parte do tempo de recreio sozinhos, demonstrando dificuldades para iniciar, manter e finalizar os contatos sociais com os colegas (Batista, 2004). Alguns profissionais argumentam que o mesmo ocorre com crianças obesas, feias, mas nem por isso tais crianças devem ser retiradas da escola. Na história da humanidade o tratamento dado às pessoas deficientes variou e muito, desde a morte (na Antigüidade), passando pelos castigos (na Idade Média) até o momento atual em que se entende que a criança deve ser ou incluída ou integrada na escola. A legislação brasileira fala em integração e a procuradoria da república fala em inclusão. Quais as diferenças e qual o papel do psicólogo escolar, na prática, em relação à essa questão?

Integração x Inclusão na Legislação

Segundo Batista (2004), tanto a integração como a inclusão priorizam a inserção da criança com NEE na escola regular. A inclusão, porém, se refere a uma inserção mais ampla, total e incondicional da criança. A integração dá idéia de uma inserção parcial, pois depende das possibilidades de cada pessoa para que ela possa ser inserida, ou não, na escola. A integração é individualizada enquanto que inclusão é coletiva requerendo transformações mais profundas no sistema de ensino.

O movimento pela integração começou a se fortalecer na década de 60, quando grupos marginalizados começaram a lutar pelos seus direitos na sociedade. No Brasil, foi implantado o sistema de classes e escolas especiais que começou a ser criticado, dentre outros motivos, por conta da segregação social a que ficavam submetidas as crianças atendidas por esse sistema. Com os maus resultados obtidos, a partir do final dos anos 80 a concepção da integração começou a perder espaço para a da inclusão.

No entendimento dos Parâmetros Curriculares Nacionais (2002, PCN) a integração não pode ser martirizada em função do mal uso que tem sido feito de sua proposta para inserção da criança com necessidades especiais na escola.

“Observe-se a legislação atual. Quando se preconiza, para o aluno com necessidades especiais, o atendimento educacional especializado preferencialmente na rede regular de ensino, evidencia-se uma clara opção pela política de integração no texto da lei, não devendo a integração – seja como política ou como princípio norteador – ser penalizada em decorrência dos erros que têm sido identificados na sua operacionalização nas últimas décadas.” (PCN, 2002)

Para a Procuradoria Federal dos Direitos Humanos (2003) a opção pela integração seria inadequada perante a Constituição Federal. No entendimento da Procuradoria, o termo educação especial se referiria à possibilidade de substituição do ensino regular pelo ensino especial, uma forma de segregação da criança que a discriminaria. A Procuradoria aponta para o texto da Constituição no artigo 205 que fala a respeito da educação ser direito de todos, visando o pleno desenvolvimento do sujeito. No entendimento da Procuradoria a Educação Especial não possibilitaria o pleno desenvolvimento da criança, nem sequer seria uma forma de educação no seu sentido genuíno.

Ainda na Constituição, um outro artigo é de importância crucial para a questão da educação especial no Brasil:

“Art. 208 - O dever do Estado com a Educação será efetivado mediante a garantia de:

III - atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino.”

No entendimento da Procuradoria não se trata de a Constituição brasileira ser favorável à integração. O termo preferencialmente se refere ao “atendimento educacional especializado” e não à educação especial, o qual existia no texto constitucional de 1969, porém foi retirado, subtendendo-se do termo atual um significado distinto do termo anterior. Assim sendo, a educação especial propriamente dita se refere a uma rede de ensino paralela à rede regular, sendo segregadora e discriminadora. O termo “atendimento educacional especializado” se referiria às aulas extras oferecidas aos ANEE na própria rede regular de ensino.

A Procuradoria aponta ainda a existência de leis que seriam inconstitucionais, por contrariarem esse artigo da constituição. Entre essas leis estaria a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN, 1996). Nessa lei consta o uso do termo educação especial definido como “a modalidade de educação escolar, oferecida preferencialmente na rede regular de ensino, para educandos portadores de necessidades especiais (art. 58).” De acordo com a LDBEN (1996), haveria a possibilidade de se substituir o ensino regular pela educação especial:

O atendimento educacional será feito em classes, escolas ou serviços especializados, sempre que, em função das condições específicas dos alunos, não for possível a sua integração nas classes comuns de ensino regular (art. 58 § 2º).”

Além disso, a LDBEN não contempla o direito de opção das pessoas com deficiência e de seus pais ou responsáveis para estudar no ensino regular, limitando-se a descrever que a escola escolherá quando a criança será encaminhada para ensino especial. O direito de opção deve caber ao proprietário do direito de acordo com a Convenção para a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Pessoa Portadora de Deficiência – Convenção da Guatemala, da qual o Brasil é signatário, por meio de decreto, desde 2001. Resumidamente, na Convenção da Guatemala, como ficou conhecida, restringir a pessoa a um contexto em função de sua deficiência, no caso à escola especial, seria limitar o seu direito à igualdade, o que caracterizaria discriminação. Portanto segregar a criança, sem o consentimento de sua família ou dela mesma numa escola especial seria contra o decreto correspondente à Convenção da Guatemala.

Existe outra importante lei em relação à educação inclusiva no Brasil, trata-se da resolução 02/2001, que fala a respeito do acesso de ANEE às escolas regulares. Nesse texto, o paradigma da educação inclusiva é citado várias vezes como sendo norteador das práticas com ANEE. Porém, em seu texto há o uso do termo educação especial, admitindo-se a sua substituição em lugar do ensino regular, como como é mostrado no próximo parágrafo.

Art. 3º “Por educação especial, modalidade da educação escolar, entende-se um processo educacional definido por uma proposta pedagógica que assegure recursos e serviços educacionais especiais, organizados institucionalmente para apoiar, complementar, suplementar e, em alguns casos, substituir os serviços educacionais comuns, de modo a garantir a educação escolar e promover o desenvolvimento das potencialidades dos educandos que apresentam necessidades educacionais especiais, em todas as etapas e modalidades da educação básica”.

Pode-se concluir que apesar de adotar os termos educação inclusiva, a educação brasileira em relação aos ANEE adota práticas integradoras, o que parece gerar certa confusão no uso desses conceitos.

Na Prática do psicólogo escolar – lidando com o preconceito...

Na prática, o psicólogo escolar está no contexto aonde ocorrem os diversos embates da inclusão: o preconceito dos professores, o preconceito dos pais e os preconceitos dos pares. O psicólogo deve atuar nesse cenário não como um mero expectador do sucesso natural ou da derrota da inclusão. Posicionar-se a favor da inclusão ou da integração requer esforços para inserir a criança na escola. Esses esforços não devem excluir os esforços para lidar com a realidade da criança obesa ou negra. Mais ainda, a convenção Educação para Todos fala a respeito da importância de se incluírem todas as minorias e aqueles que estejam em maior desvantagem. Isso na verdade é inclusão. O psicólogo escolar deve, portanto, estar preparado para trabalhar o tema da exclusão entre as crianças, entre os professores e entre os pais. Técnicas do psicodrama ou o sociodrama poderiam ser utilizados no contexto escolar para possibilitar tratar dessas questões relativas às diferenças, à proximidade e à distância relacional entre os indivíduos (Batista, 2004).

A sociometria, por exemplo, pode ser utilizada para medir a proximidade dos alunos entre si, com o objetivo de avaliar as relações de exclusão numa sala de aula. É possível que seja usada a seguinte proposta de dinâmica para trabalhar a inclusão e os preconceitos.


Proposta de dinâmica psicodramática sobre educação inclusiva

Objetivo: proporcionar as crianças reflexão sobre a exclusão das crianças na escola.

Ferramentas: Recortes de revistas com balões (caixas de diálogo) em branco, o que pode ser feito no computador.

Membros: alunos, professores ou pais.

Os participantes devem construir em grupo uma história em quadrinhos com base em figuras recortadas. Posteriormente encenam a cena que criaram. No fechamento cada um conta o que sentiu. O diretor pode paralisar a cena e fazer duplos, etc...

Maurício de Souza criou dois personagens da Turma da Mônica que permitem falar diretamente sobre a questão da deficiência física. São eles: Dorinha, uma garota cega e Luca, um menino que anda em cadeira de rodas. A figura inicial do "post" mostra um exemplo de uma história que foi construída a partir da personagem Dorinha englobando o tema da inclusão na escola.